quarta-feira, 9 de maio de 2012

Cremern decide por interdição ética

Margareth Grilo - repórter

A Unidade de Emergência (reanimação) do Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel/Clóvis Sarinho, usada costumeiramente, nos últimos meses, para a internação de pacientes graves que precisam de leito de terapia intensiva, está interditada eticamente. Permanecem na unidade apenas os pacientes que deram entrada até ontem. Por decisão do Conselho Regional de Medicina no Rio Grande do Norte (Cremern), a Reanimação não pode receber novos pacientes e acomodá-los em leitos improvisados de UTI.

A Resolução 003/12, do Cremern, que estabelece a interdição ética do exercício profissional no setor de reanimação do Pronto Socorro Clóvis Sarinho foi  aprovada na noite de terça-feira, 7, e encaminhada ontem à tarde, à secretária interina da Saúde Pública Estadual, Dorinha Bularmaqui, ao diretor administrativo do HMWG, Josenildo Barbosa, e às promotorias de Justiça da Saúde, do Ministério Público Estadual. 

Na resolução, o Cremern determina providencias a serem adotadas na Unidade de Emergência, entre elas, manter médicos qualificados na unidade para dar assistência nas 24 horas;  reparar ou adquirir camas específicas para substituir as sucateadas; manter reserva de, no mínimo, dez por cento dos equipamentos; e reabastecer a unidade de medicamentos, principalmente de antibióticos.

Por vários dias, chegou a faltar, segundo depoimento de médicos e enfermeiros ouvidos semana passada pela TN, adrenalina, substância vital numa parada cardíaca, e trombolíticos, utilizado em quadros de acidentes vasculares. Em nota, no início da noite, a  Secretaria de Estado da Saúde Pública (Sesap) informou que encaminhou uma equipe de técnicos para o hospital. 

Essa equipe vai readequar os serviços da unidade e providenciar o abastecimento de insumos para que as atividades no setor de reanimação não tenham descontinuidade. A nota não esclarece como serão feitas as transferências dos pacientes para leitos de UTI e qual será o procedimento em relação aos pacientes novos.

Com a decisão do Cremern, a Sesap terá que providenciar, nos próximos dias, leitos de UTI, seja na rede pública ou privada, para a transferência desses pacientes, e passar a utilizar a Unidade de Emergência para seu fim específico, que é a reanimação do paciente. "Em momento algum, essa unidade", afirmou Jeancarlo Fernandes, "era para ter pacientes graves com necessidade de UTI internados. A rigor ela não deve ter leito de internação, ainda mais se não tem médico 24 horas ou mesmo um técnico".

No geral, o HMWG está trabalhando com 1 técnico para cada 16 pacientes, situação verificada pela equipe da TRIBUNA DO NORTE na quarta-feira, 2. Pelas normas de saúde pública, para cada dois leitos de UTI o hospital deve manter um técnico de enfermagem. A decisão do Cremern teve por base o relatório da inspeção realizada na sexta-feira, 4, quando os fiscais encontraram nove pacientes graves, entubados, falta de médicos na unidade por 24h e de medicamentos. 

"A decisão é dura, mas não há outra saída" disse Jeancarlo Fernandes.  Segundo a Assessoria de Imprensa do hospital, a direção resolveu a situação do lixo e está encaminhando as compras de materiais e medicamentos. Ontem,  seis pacientes estavam na reanimação. No hospital, 13 pacientes graves entubados em diversas unidades, entre elas, Politrauma e  Observação Clínica, aguardavam um leito de UTI. Os dados são da Unidade de Gerenciamento de Vagas - UVG.

Pacientes de ortopedia lotam os corredores

Nos corredores, a situação de superlotação e de sobrecarga não mudou.  Segundo informações da UVG, às 7h, o número de pacientes internados nos corredores era de 80, dos quais 46 eram da ortopedia. Um dos problemas da ortopedia é a lentidão da transferência de pacientes para os três hospitais privados que realizam as cirurgias - Memorial, Médico Cirúrgico e Clínica Paulo Gurgel. 

Fernando José da Silva, 49 anos, foi atropelado e aguarda há três meses por uma transferência. Ao lado dele, Robson Fernandes da Silva já aguarda há 10 dias. "A gente nem sabe quem é o médico. Hoje, de manhã eu mesmo que fiz meu curativo. Dizem que tem 100 pessoas na fila de espera para a cirurgia", acrescentou Robson.

Judaico Nascimento Gonçalves, 30 anos, sofreu acidente na sexta-feria, 4, fez cirurgia de urgência, mas aguarda a transferência para uma das unidades privadas credenciadas para uma segunda cirurgia. Judaico é porteiro e disse que o trabalho já está exigindo o  atestado médico. Nos quatro dias de internamento, contou, ainda não recebeu visita do médico e não tomou banho. "Temo ficar aqui dias e até meses", desabafou.

Todos são casos da ortopedia, cujas cirurgias são custeados pelo município de Natal, em parceria com o Estado. Segundo a diretora de Regulação da Secretaria Municipal de Saúde, Maria da Saudade Azevedo, a suspensão de cirurgias por parte dos ortopedistas vinculados à Cooperativa de Médicos do RN, ma semana passada, por falta de repasses, gerou acúmulo. Segundo ela, no sábado, foram liberamos 15 leitos na rede credenciada. 

Saudade adiantou que o município está lançando, nos próximos dias, uma chamada pública para contratação de novos serviços de traumato-ortopedia. "O grande problema", disse ela, "é que Natal está sobrecarregado, custeando cirurgias de pacientes de todo o Estado". Em 2011, foram realizadas mais de 6 mil cirurgias ortopédicas, num custo de R$ 7,5 milhões. Segundo informações da UGV do Walfredo, depois da retomada das cirurgias, na segunda-feira, foram feitas apenas quatro transferências.

Sesap e A.Marca confirmam presença em reunião do Conselho

A Associação Marca e a secretária interina de Saúde Pública, Dorinha Bularmaqui confirmaram presença na plenária do Conselho Estadual de Saúde (CES-RN), que ocorre a partir das 8h30. A interina da Sesap vai dar explicações sobre a forma de contratação da A.Marca para a gestão do Hospital Parteira Maria Correia - o Hospital da Mulher, de Mossoró. O Termo de Parceria, que envolve recursos da ordem de R$ 15,9 milhões, foi assinado em 29 de fevereiro, sem licitação.

Os conselheiros querem acesso a informações sobre modalidade de compras; e de contratações de pessoal; e acesso às planilhas de custos das obras de readequação do prédio. O representante da A.Marca deve fazer a apresentação da Execução Financeira do Termo de Parceria e às 10h30 a interina da Sesap apresenta o Plano de Gestão da Sesap para o Hospital da Mulher. A plenária do CES-RN acontece no 12º andar do prédio da Sesap.

O Termo de Parceria já originou três procedimentos investigatórios. A 1ª Promotoria de Justiça, do Ministério Público Estadual, em Mossoró, abriu  inquérito no dia 1º de março para apurar as denúncias levantadas pelo CES. Para o promotor Flávio Corte a falta de consulta prévia ao CES, a contratação sem licitação e a rapidez na formalização do contrato e inauguração da unidade levantam suspeitas. 

Nos primeiros 32 dias de funcionamento da unidade, que foi inaugurada dia 8 de março, a A.Marca recebeu R$ 8,033 milhões, conforme informações extraídas do Portal da Transparência do Governo do Estado. Em outras duas frentes, o Ministério Público do Trabalho e o Ministério Público Junto ao Tribunal de Contas do Estado também investigam o contrato. 

O MPT vai verificar a formalização dos contratos quanto à terceirização de atividade-fim. Segundo o CES-RN, a A.Marca estaria, inclusive, 'quarteirizando' a atividade-fim (médicos e enfermeiros), por meio de subcontratos com empresas de fora do Estado. De acordo com a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) em seu artigo 581 do segundo parágrafo, é ilegal a terceirização ligada diretamente ao produto final.

Na última segunda-feira, 7, a promotora Iara Pinheiro falou à TRIBUNA DO NORTE e disse que o MP tem se contraposto inclusive por ações judiciais à terceirização da atividade-fim na área da saúde. "Apesar de a terceirização não ter respaldo na legislação", disse a promotora, "percebemos que os recursos financeiros são fortemente concentrados nesse dispositivo assistencial, que é, no mínimo, polêmico". É patente, segundo Iara Pinheiro, a inversão: enquanto deixa de estruturar a  rede estadual, o governo tem resolvido de forma emergencial as  lacunas assistenciais, "lançando mão da terceirização e dando ao privado o lastro financeiro que não dá as unidades próprias".


Fonte: tribuna do norte

0 comentários:

Postar um comentário