sábado, 12 de maio de 2012

Por falta de vagas em CEDUCs justiça decide liberar infratores

Marco Carvalho - repórter

Adolescentes em conflito com a lei poderão ser postos em liberdade em virtude da ausência de vagas nos Centros Educacionais do Rio Grande do Norte. Nesta semana, o juiz da 3ª Vara da Infância e Juventude da Comarca de Natal, Homero Lechner de Albuquerque, decidiu pela liberação de três menores por não ter encontrado local para enviá-los. Os jovens eram suspeitos de envolvimento com furtos e assaltos a mão armada e mesmo assim acabaram soltos após um período de apreensão provisória. A decisão inédita no Rio Grande do Norte poderá ser repetidamente aplicada para outros casos a serem julgados. Não há previsão de alteração a curto prazo do cenário considerado caótico nos Ceducs.
Adriano AbreuMesmo parcialmente interditado, Centro Educacional do Pitimbu continua superlotado e sem instalações adequadasMesmo parcialmente interditado, Centro Educacional do Pitimbu continua superlotado e sem instalações adequadas

A decisão de liberdade é um direito previsto na Lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), em seu artigo 49º: "ser incluído em programa de meio aberto quando inexistir vaga para o cumprimento de medida de privação da liberdade". A lei prevê exceções "nos casos de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência à pessoa, quando o adolescente deverá ser internado em Unidade mais próxima de seu local de residência". O juiz Homero Lechner prevê que novos casos acontecerão, caso o Estado não promova mudanças emergenciais nas suas estruturas. "Com certeza novas liberações vão ocorrer, caso não se altere em nada a atual situação", disse Lechner.

No caso dos três adolescentes liberados para cumprir a medida de internação no programa de meio aberto, e aguardar em casa eventual vaga em regime de internação, o magistrado procurou vagas em Parnamirim, Caicó e Mossoró. O juiz oficiou às três unidades e os diretores o retornaram informando sobre a indisponibilidade de vagas. "Tenho que obedecer à lei. Infelizmente, a sociedade agora fica à mercê de adolescentes em conflito com a lei", disse à reportagem da TRIBUNA DO NORTE durante a manhã de ontem.

Lechner relatou que, em 11 anos de magistratura, nunca havia tomado ou visto decisão semelhante. "Nunca ocorreu de faltar vaga, apesar da recorrente superltoção. A situação agora se mostra cada vez mais caótica", afirmou. Vinte e sete adolescentes estão apreendidos provisoriamente no Centro Integrado de Atendimento ao Adolescente Infrator (Ciad) em Natal e passarão por audiência. Caso seja necessário cumprimento de medida em regime fechado, o menor poderá retornar à sociedade devido à falta de vagas.

O Poder Judiciário informou ainda que há 50 mandados de apreensão expedidos contra adolescentes infratores. Os menores passarão pelo Ciad, caso sejam encontrados, e ficarão sujeitos à mesma situação dos demais já citados. Cada vez mais, o Estado se exime da atividade de ressocialização de menores infratores e reforça a violência percebida nas ruas. "Todos estão indignados com isso, mas o Estado não está nem aí".

Responsabilidades

A decisão judicial que permitiu a liberação de três adolescentes terá cópia enviada ao Ministério Público Estadual. De acordo com o juiz Homero Lechner, o objetivo é que se apure as responsabilidades da ausência de vagas nos Centros Educacionais. O MP irá investigar a possível improbidade administrativa que resultou no problema recorrente.

Para o magistrado, existe até a possibilidade de intervenção no sistema. "Cabe ao Ministério Público a função de encampar uma Ação Civil Pública sobre o assunto", disse. Na visão do magistrado, o Estado deverá assumir uma parcela de responsabilidade. "O Governo não pode dizer que não sabia que isso ia ocorrer. Tem a obrigação de saber. Existe solução, basta dotação orçamentária. Gestor não faz nada sem recursos". 

A reportagem procurou a resposta do presidente da Fundac, instituição responsável pela administração dos Ceducs, mas foi informada que Getúlio Batista da Silva se encontrava em Brasília. 

Centro está parcialmente interditado 

Dentre as unidades problemáticas, aquela que certamente mais se destaca é o Centro Educacional do Pitimbu. As deficiências enfrentadas pelo Ceduc podem levá-lo ao fechamento. Em inspeção realizada no final do mês de abril desse ano, a juíz Ilná Rosado Motta, da Vara da Infância, Juventude e Idoso de Parnamirim, reiterou essa possibilidade. 

A magistrada determinou reformas e  em maio retornará ao local para verificar o andamento das obras. Desde março, a unidade está proibida de receber novos internos A decisão da juíza foi tomada com base no resultado de relatórios feitos pela Subcoordenadoria de Vigilância Sanitária do Estado (SUVISA), Corpo de Bombeiros e da Polícia Militar, os quais apontam problemas graves que vão desde a alimentação à falta de segurança do local. 

Essas deficiências apontadas no CEDUC comprometem o objetivo da execução da medida, o da ressocialização dos adolescentes por estarem em condições totalmente inadequadas, bem como a dignidade e até a segurança das pessoas lá internadas, conforme laudos acostados. 

Coordenadoria vai discutir alternativas

A Coordenadoria Estadual da Infância e Juventude (CEIJ) realizará na próxima segunda-feira uma reunião para discutir e buscar uma solução para a falta de vagas no sistema socioeducativo de internação do Estado. O presidente da CEIJ, juiz José Dantas Paiva, convocou a reunião em virtude dos problemas recorrentes constatados. O encontro contará com a participação do juiz da 3ª Vara da Infância e Juventude, Homero Lechner, o presidente da Fundac, Getúlio Batista e os promotores Mariana Rebello de Sá e Marconi Antas Falcone de Melo da 5ª e 81ª Promotorias da Infância e Juventude, respectivamente.

Através de nota emitida pela assessoria de comunicação, o Tribunal de Justiça se manifestou afirmando que "essa situação já vem sendo discutida há bastante tempo pelo Judiciário Potiguar, que tem feito vários alertas ao Governo do Estado, mas até o momento o problema não foi resolvido".



Fonte: Tribuna do Norte

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