domingo, 6 de maio de 2012

Pesquisa no RN usa matemática da fala no diagnóstico psiquiátrico


Um MP3, um computador e uma boa ideia. Foram os meios suficientes para pesquisadores do Rio Grande do Norte conseguirem um feito que está sendo comemorado pela ciência. Com apenas esses meios, a médica do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Natália Mota, liderou uma pesquisa que descobriu que a análise matemática da fala pode revelar transtornos psiquiátricos e até flagrar uma esquizofrenia.
 
 (Carlos Santos/DN/D.A. Press)
Natália já vislumbra possibilidades de aplicação clínica da pesquisa devido à estimativa de 90% de precisão do diagnóstico, bem maior do que os cerca de 67% das escalas usadas pelos psiquiatras. A pesquisa é apenas uma mostra da grande produção na área de neurociências do Instituto do Cérebro que tem como diretor o cientista Sidarta Ribeiro.

Recentemente, a pesquisa foi destaque no caderno de Ciências da Folha de São Paulo, bem como na publicação científica internacional "PLoS ONE". O trabalho de Natália foi criar um método quetransforma em gráficos (grafos) o discurso dos pacientes, comprovando que a forma como alguém conta uma história pode revelar transtornos psiquiátricos. Desde 2006, quando começou a ser desenvolvido, o trabalho envolveu um grupo de cientistas de várias especialidades do Instituto do Cérebro que criaram um modelo e a partir dele foi possível identificar padrões e correlações que são bastante específicos das psicoses. Apesar da taxa de sucesso no diagnóstico, Natália ressalta que o método deve complementar as avaliações usadas atualmente pelos psiquiatras porque não substitui a experiência do consultório.

Aplicação do método

No experimento, os cientistas analisaram 24 pessoas, sendo oito delas com diagnóstico prévio de esquizofrenia, oito de mania e oito sem psicoses diagnosticadas. A pesquisa consiste em um protocolo simples, que é a aplicação da escala diagnóstica, as principais escalas que medem a mente com sintomas em psiquiatria. Segundo conta Natália, o primeiro passo foi gravar e transcrever o relato deum sonho por um paciente. Depois, para destacar os pontos da fala, o texto é aplicado na representação dos grafos que é uma representação muito conhecida na matemática, bastante utilizada no cotidiano, como na internet e nos aeroportos.

O programa indica pontos de conexão da conversa, apresentando diferenças no discurso dos voluntários. Os resultados são simples de interpretar visualmente. Os grafos dos pacientes com mania são muito mais densos, com várias idas e vindas em relação ao tema do relato. Em geral, a pessoa "se perdia" mais na conversa, uma característica marcante das pessoas com esse transtorno. Já os grafos dos pacientes com esquizofrenia são mais retilíneos. Os pacientes tendem a falar menos, a ser mais contidos no relato de suas experiências. "Um psiquiatra treinado é capaz de, em uma conversa longa no consultório, chegar às mesmas conclusões", diz ela.

Atualmente, os instrumentos se baseiam no exame psíquico, uma avaliação de um médico psiquiatra treinado que tem a experiência de observar vários aspectos do comportamento do paciente até chegar a uma conclusão diagnóstica sobre a patologia. As escalas que tentam quantificar os sintomas se baseiam num critério de notas, mas isso denota tempo porque não é um método objetivo e depende da interpretação de um profissional experiente. "Esses padrões de discurso já são notados, o que nós criamos agora é uma forma mais rápida e quantitativa de abordar a questão", explica Natália Mota.

A experiência pode ser usada em outras áreas da psiquiatria e não apenas na área das psicoses. Pode ser utilizado para estudar o discurso de pacientes autistas e com transtorno de ansiedade para observar uma metodologia de estudo e desenvolvimento da linguagem. "A gente espera contribuir mais. Nossa perspectiva é buscar a validação clínica para o método. Estamos trabalhando nisso no mestrado, queremos aumentar a mostra e buscar o maior número de sujeitos que se interessem em participar". Se algum paciente se interessar pela metodologia e quiser participar em caráter experimental pode procurar a médica pelo e-mail nataliamota@neuro.ufrn.br e fazer um agendamento de consulta no Hospital Universitário Onofre Lopes.

Perfil

Natália Mota formou-se em medicina pela UFRN, em 2007, onde também fez psiquiatria. Desde estudante sempre gostou da psiquiatria na área de saúde pública. Já trabalhou em dois Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) que lhe ajudou na formação, fez parte do Instituto Internacional de Neurociências de Natal. "Percebemos que na psiquiatria ainda há muito que se descobrir porque é muito estimulante, o que nos dá esperança. E essa interação da pesquisa com a clínica melhoram as possibilidades terapêuticas e medicamentosas", diz ela.


Fonte: DN Online

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